segunda-feira, 24 de setembro de 2012









27 Como é estranho. Mas é assim. Escamoteados hoje no futuro, estamos à mesma cheios de futuro. Porque todo o projecto é para a eternidade. Mesmo que se não acredite nela ou nele. Quando a eternidade estava no além, não se sabia que estava no aquém, ou seja em nós. O Além absorvia toda a instabilidade terrena. Mas encerrada aquela, ficámos com o transitório desta.  E foi então pensámos que esse transitório não podia ser. Porque a eternidade não se mede pela sua duração mas pela intensidade com que vivemos. No amor. Numa obra de arte. Num projecto devorador. O grande profeta político é sempre a eternidade que promete, porque sabe que essa é a sua medida inteligível. Hitler prometeu-a para mil anos, entendendo certamente que era bastante para se esquecer. Mas foi o marxismo-leninismo que, para acabar com mais questões, nos decretou o fim da História. O dos mil anos não chegou aos vinte. O do fim da História aguentou-se um pouco mais. Mas eis que também ele foi derrubado da sua mania  de titã. O vesgo capitalismo insinuou-se em infiltração no bloco de cimento armado (pela polícia) e fê-lo estalar. Polónia, Hungria e o mais. Mas como supor que a utopia acabou?
Há um combate a decidir entre ela e a vida. Mas só se decide no infinito. Porque o homem é o futuro de si, ou seja o mais que nunca é. Penélope não desfazia a teia apenas para suster os seus pretendentes, mas para não ficar sem trabalho. Ou seja, sem o mais que mora no impossível.



 in Vergílio Ferreira "Pensar" 1992
 pag 41/42 Bertrand Editora

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